Com isso famílias permanecem no local até que haja o julgamento definitivo
Em 07 de maio de 2021 / Júlio Andrade
Itaguaí – O Desembargador ALEXANDRE SCISINIO da Vigésima Câmara Cível do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, suspendeu o cumprimento da ordem liminar de reintegração de posse proferida anteriormente, que obrigava as centenas de famílias que estão ocupando um terreno no bairro Ponte Preta em Itaguaí a sairem do local. A antecipação do pedido de tutela feita pela Defensoria Pública do Estado, tem validade até o julgamento definitivo do recurso. O juízo que decidiu pela reintegração de posse do local em ação movida pela Petrobrás, foi notificado da decisão do Desembargador.
Entre os motivos para suspender a desocupação do terreno pelas famílias, estão:
• A não intimação anteriormente a Defensoria Pública, já que a decisão afeta interesse de um grupo considerável de pessoas em estado de vulnerabilidade, algo que foi apontado na decisão do juiz de plantão que primeiro foi submetido ao pedido liminar e que a negou a Petrobrás;
• a não realização de nenhuma audiência de mediação;
• e a decisão do Conselho Nacional de Justiça que expressamente aconselha aos órgãos do Poder Judiciário que, enquanto perdurar a situação da pandemia do COVID-19, analisem com cautela o deferimento de tutela de urgência que tenha por objeto desocupação coletiva de imóveis urbanos e rurais, sobretudo nas hipóteses que envolverem pessoas em estado de vulnerabilidade social e econômica.
Essa decisão do CNJ em seu parágrafo único do artigo 1º da Resolução, ainda enfatiza que a avaliação poderá considerar, dentre outros aspectos, o grau de acesso da população afetada às vacinas ou aos tratamentos disponíveis para o enfrentamento da pandemia, sendo certo que, no Estado do Rio de Janeiro, segundo dados oficiais, o número de pessoas que recebeu a segunda dose da vacina contra o COVID-19 equivale hoje a apenas 6,51% da população do estado.
Com isso, a ocupação continua na área até que o mérito seja julgado de acordo com os ritos judiciais e sempre levando em conta a situação de pandemia no Estado do Rio de Janeiro.
Relembre
Cerca de 500 famílias ocupam desde o dia 1° de maio um terreno em desuso da Petrobrás. Batizada de “Acampamento de Refugiados Primeiro de Maio”, a ocupação está sendo organizada pelo Movimento do Povo, com o apoio da Federação Única dos Petroleiros (FUP), do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF) , do diretório do Partido dos Trabalhadores (PT) de Itaguaí, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Central Única das Favelas (Cufa), entre outras organizações sociais e movimentos sindicais.
Nosso blog pôde constatar que pelo menos 500 famílias já ocupam o local. Ouvimos testemunhos de dezenas de pessoas sobre a dificuldade de amparo das políticas públicas do País e na falta de oportunidades de emprego, o que culmina nessa necessidade básica de moradia. De crianças a idosos, o local retrata claramente a dor de quem já tentou de tudo para ser reconhecido, mas o preconceito e a falência de toda a política nacional de desenvolvimento segrega cada vez mais boa parte da população mais carente, ainda mais durante a pandemia.
As famílias necessitam de doações. Quem puder contribuir basta procurar por Erik. As maiores necessidades são alimentos e lonas para as barracas feitas de bambu.
Protesto
A ocupação foi organizada como um protesto contra a falta de moradia, de comida e de vacina da covid-19, segundo a FUP informou em nota. Também contra a política de preços dos combustíveis adotada pela Petrobras, baseada no Preço de Paridade de Importação (PPI).
“Essa mobilização quer chamar atenção da sociedade para a importância da Petrobras e denunciar a política covarde de reajustes dos combustíveis que a gestão da empresa aplica desde 2016, com apoio do governo federal. Nessa crise social e econômica provocada pela pandemia, muita gente está usando lenha e álcool para cozinhar, isso quando tem comida, porque o gás de cozinha está caríssimo. Quem lucra com isso são os acionistas da Petrobras e quem está pagando a conta é a população mais pobre, o trabalhador e a trabalhadora”, explica Alessandro Trindade, diretor do Sindipetro-NF.
Polo não saiu do papel
O local escolhido para a ocupação fica em frente ao antigo Boteco Cadena, no bairro Ponte Preta – na avenida Deputado Octávio Cabral, em Itaguaí. O terreno seria utilizado para instalar o Polo Petroquímico e a Zona de Processamento e Exportação da cidade, no entanto, o projeto nunca saiu do papel.
O polo foi planejado pelo governador do estado do Rio de Janeiro, Moreira Franco, em parceria com a Petrobras, em 1986. Através de um decreto, o então presidente Sarney estabeleceu Itaguaí como a sede. A pedra fundamental da obra chegou a ser lançada, com licença do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e todos os estudos de impacto necessários a uma obra desse porte.
Procurada, a assessoria da Petrobras não respondeu aos questionamentos sobre o uso do terreno e o porquê de os projetos não terem sido operacionalizados até hoje.
Em nota, a petroleira apenas disse que “confirma que o terreno pertence à companhia e que está adotando as medidas cabíveis para reintegração da área”.
Trindade, diretor do Sindipetro-NF, rebate argumentando que o terreno pertence à Petrobras e, portanto, à União. “É um terreno da Petrobras e, portanto, da União. Logo, é um terreno do povo brasileiro, por isso criamos esse acampamento aqui. Em vez de as pessoas morarem na rua, elas têm de ter acesso a terra e comida”, conclui.